O texto de ontem foi emocional, falei do que sentia. Hoje, deixo algumas informações mais técnicas para ajudar as mães a fazerem escolhas conscientes e decidirem (ou não) pelo desmame dos seus filhos com autonomia.
Listei motivos comuns pelos quais o desmame é rotineiramente aconselhado e explico, com base na literatura, os equívocos de cada um:
1) A criança não aceita outros alimentos, ou não come o suficiente.
Com nossos conhecimentos atuais, o mais prudente é começar a oferecer outros alimentos aos seis meses. Algumas crianças comem alegremente e, provavelmente, algumas precisam deles de verdade. Mas dizemos “oferecer”, e não “enfiar”. A criança é livre para comer ou não. Muitas crianças de peito não querem nem provar qualquer outro alimento até os oito ou dez meses, ou até mais. Estão perfeitamente saudáveis e felizes, seu peso e tamanho são normais, seu desenvolvimento psicomotor é excelente... mas recebem o suficiente com o peito e, portanto, não querem mais nada.
Isso produz não pouca inquietação nas mães de lactentes entre seis e doze meses, mais ou menos. Seus filhos mal “beliscam” alguma coisa (uma mordida de banana aqui, um miolo de pão acolá, um macarrão mais pra frente) além do peito. Sempre se escuta algum comentário gentil: “Sua Laura ainda não come nada? Pois você tinha que ver minha Jéssica, como ela gosta de cereais com leite”.
Quem ri por último ri melhor. As crianças de peito demoram a aceitar outros alimentos, mas quando o fazem costumam desprezar as papinhas industriais e os alimentos triturados e se lançar à comida de sua mãe. No começo do seu segundo ano, a criança de peito costuma comer lentilhas com linguiça, omelete de batatas e sanduíches de presunto, tudo isso a colheradas e mordidas com sua própria mãozinha.
Mi niño no me come (Meu filho não come). Carlos González, pediatra espanhol.
(Tradução minha).
Lembrando que, muitas vezes, achamos que a criança está comendo pouco quando, na verdade, ela está comendo exatamente o que precisa.
Se a criança está mamando no peito, três refeições por dia com alimentos adequados são suficientes para garantir uma boa nutrição e crescimento, no primeiro ano de vida.
Guia Alimentar para Crianças Menores de Dois anos, Ministério da Saúde.
2) A criança não está ganhando peso ou crescendo adequadamente.
Se uma criança amamentada não estiver crescendo adequadamente no segundo ano de vida, os esforços devem concentrar-se na melhoria da qualidade nutricional e quantidade dos alimentos complementares e não na interrupção da amamentação (Bentley et al., 1997). Essa sugestão é reforçada com o estudo feito em Bangladesh onde as crianças desnutridas não amamentadas além do primeiro ano tiveram um risco seis vezes maior de morrer, quando comparadas com as amamentadas (Briend e Bari, 1989).
Guia Alimentar para Crianças Menores de Dois anos, Ministério da Saúde. (grifo meu)
3) Se amamentada por muito tempo, a criança pode desenvolver dependência excessiva da mãe, problemas psicológicos e sexuais.
O período natural de amamentação (sem a influência da cultura), segundo diversas teorias, seria de 2,5 a sete anos. Estudos etnográficos sugerem que, antes do uso disseminado de leites não humanos para crianças, elas tradicionalmente eram amamentadas por três a quatro anos, época em que as crianças usualmente deixam de amamentar quando lhes é permitido alimentar-se de acordo com a sua vontade (Dettwyler, 1995). A OMS recomenda que a amamentação seja praticada até os dois anos ou mais (World Health Organization, 1995a).
Guia Alimentar para Crianças Menores de Dois anos, Ministério da Saúde.
Quando a psicóloga da creche soube que Maribel estava dando o peito a seu filho de dezesseis meses, chamou-a para lhe explicar que se não o desmamasse imediatamente, seu filho seria homossexual. (...)
Como Maribel persistiu em sua “perigosa” atitude, a psicóloga ligou para sua casa para falar diretamente com seu marido e adverti-lo sobre o dano que sua esposa estava fazendo ao filho de ambos.
Nossa sociedade, tão compreensiva em outros aspectos, é muito pouco compreensiva com as crianças e com as mães. Esses modernos tabus poderiam ser classificados em três grupos:
- Relacionados ao choro: é proibido dar atenção às crianças que choram, pegá-las no colo, dar-lhes o que pedem.
- Relacionados ao sono: é proibido fazer as crianças adormecerem no colo ou lhes dando o peito, cantar ou niná-las para que durmam, dormir com elas.
- Relacionados à amamentação: é proibido dar o peito em qualquer momento ou em qualquer lugar, ou a uma criança “muito grande".
Quase todos eles têm uma coisa em comum: proíbem o contato físico entre mãe e filho. Pelo contrário, são muito apregoadas todas aquelas atividades que tendam a diminuir dito contato físico e aumentar a distância entre mãe e filho.
(...)
Ainda que alguns tentem justificar essas recomendações dizendo que é para que “a mãe descanse”, o certo é que nunca te proíbem nada cansativo. Ninguém diz: “Não limpe tanto, que a criança se acostumará a ter a casa limpa”, ou “Ele vai servir ao exército e você vai ter de ir junto para lavar a roupa dele”. Na realidade, o proibido costuma ser a parte mais agradável da maternidade. (...)
Todos esses tabus e preconceitos fazem as crianças chorarem, mas também não tornam os pais mais felizes. A quem satisfazem, então? Talvez a alguns pediatras, psicólogos, educadores e vizinhos que os propagam? Eles não têm o direito de lhe dar ordens, de lhe dizer como você deve viver sua vida e cuidar de seu filho. Muitas famílias sacrificaram sua própria felicidade e a de seus filhos no altar de preconceitos sem fundamento.
Bésame Mucho. Carlos González, pediatra espanhol.
(Tradução minha).
4) Os dentes do seu filho estão nascendo. Hora de desmamar.
O único inconveniente de dentes na amamentação são as mordidas que eventualmente podem ocorrer. Aconteceu comigo, e nós superamos essa fase.
No mais, a lactação protege a arcada dentária de deformidades que possam ser causadas por chupetas ou mamadeiras. O peito sacia a necessidade de sucção, dispensando a chupeta, e a necessidade de oferecer outros líquidos pela mamadeira. Uma criança de seis meses, que deve começar a receber outros alimentos, está apta a beber num copinho de treinamento ou mesmo num copo normal, com auxílio. Recém-nascidos, e até pré-maturos, são capazes de beber de um copinho de café.
No mais, a primeira dentição não é chamada de dentes de leite à toa.
5) Você engravidou, então tem de desmamar.
Já falei sobre isso aqui e aqui.
Por hoje é só. Amanhã encerro mais esta série de posts sobre aleitamento com um Manifesto em defesa da amamentação.
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