O som. Deveria ser a primeira sensação. O choro que não ouvi. E meus olhos, num reflexo, viram aquele serzinho branco, coberto de sangue, erguido por mãos desconhecidas, bem no alto, como um troféu. Esperei, e meus ouvidos receberam a música tão desejada. O choro era o dela.
Não sei quanto tempo depois - o tempo seguia diferente naquele momento confuso -, recebi-a em meus braços. Rígida pelas mantas nas quais estava envolta, protegida contra uma eventual falta de jeito da recém-mãe, trêmula. Vi seu rosto inchado, seus olhos bem abertos. Olhei-a fundo nos olhos, enquanto escutava sua respiração chiada. Não pude tocar sua pele, mas beijei-lhe o rosto sujo repetidas vezes antes de devolvê-la à pediatra.
O tato. Deveria tê-la sentido logo no primeiro minuto. Mas foi só no dia seguinte que toquei seu corpinho nu, só de fralda. Ela parecia contente na encubadora, mesmo cheia de tubos nas mãos e eletrodos no peito. Os olhos bem abertos e a boca pronta para sugar.
O paladar. O dela. Molhei seus lábios com algumas gotas de colostro, antes de colocar meu seio em sua boca. Foi difícil no começo. Nós duas estávamos aprendendo. Mas a cada contato, íamos nos conhecendo.
Depois ela me foi entregue definitivamente. E compreendi que o cheiro de bebê, o cheiro do nosso bebê, é a coisa mais inebriante do mundo. Já tinha ouvido falar desse cheiro. Já tinha sentido não tão de perto o odor mais suave de outros bebês. Mas o cheiro dela era o aroma perfeito para despertar em mim a mais profunda paixão. Ele infesta tudo. Entro na área de serviço, e as roupas dela exalam um aroma muito mais forte que o de sabão de coco. Me debruço sobre o carrinho para tocá-la, e é como se enfiasse o nariz no miolo de uma flor.
E a cada dia, novas sensações. Seu sorriso. Eu sorrio, ela sorri. E sorrio outra vez. Vejo seus olhinhos se apertando, as bochechas se inchando, a boca bem aberta, a gengiva sem dentes, a língua virada. E um sentimento de bem-estar me invade.
E às novas expressões, vêm somar-se os novos sons. Os ruídos indescritíveis, que nosso alfabeto não consegue reproduzir, e que enchem nossa alma de prazer.
É delicioso sentir minha filha.
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Há 2 meses
7 comentários:
Disse tudo! Ter um bebê é mesmo uma experiência sinestésia inebriante e deliciosa!
Beijos
Adorei o texto!
que lindo, emocionei!
(e tô sempre acompanhando as fotos pelo Picasa, ela tá cada dia mais grandona e linda!)
beijos!
Que lindo, lia. Tenho certeza que a mãe natureza enfeitiça a gente de propósito. E cheiro e sorriso é golpe baixo, né não?
ps: to aqui rindo, primeiro dos seus commentários lá em casa; depois dos comentarios no blog da paloma "quando o segundo nascer tals, quando nascer o terceiro vão pro quarto tals". Cê já organizou até isso na cabeça, onde vão ficar os segundo e terceiro filho, é isso?
a terapia vai bem, obrigada? :)
Ai Lia... Estou nos 45 do segundo tempo. Ler esses posts emocionantes é uma forma de me transportar para o futuro que está bem próximo. Imagino-me após o parto, conhecendo-a pelo olhar sem dizer uma só palavra. Não consigo descrever como será essa emoção, mas nos seus posts, posso imaginar... Um beijo! (obs: por favor, poderia me enviar seu email para que eu refizesse a perguntinha do parto? Obrigada desde já!)
Oi Lia. Seu texto é lindo, bem feito, bem dito. Eu acrescentaria o sexto sentido, que nasce junto com o nosso filho. As vezes já o temos, e ele se aflora ainda mais. Impressionante isso de sexto sentido q tenho com Arthur. Mas acho que é comum-de-mãe, como aquela classificação de gênero dos substantivos heheheheh. Bjos
ai, que post delicioso. eu até hoje sinto o cheiro do caio em tudo, até quando ele passa alguns dias fora... loucura, né?
e a intensidade dos sentimentos é maluca mesmo, ainda hoje me peguei chorando copiosamente porque ele resolveu brincar de me encher de beijos: beijava uma bochecha, olhava nos meus olhos, ria, beijava a outra, olhava nos olhos, ... e assim foi por alguns inesquecíveis minutos. É demais da conta, né não???
beijo!!
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