Quem está grávida pela primeira vez já deve ter ouvido: “Aproveite os paparicos porque depois que nascer, as pessoas só vão querer saber do bebê.” E quem está grávida pela segunda, terceira, quarta vez sabe que isso é a mais pura verdade – com o agravante de que os mimos durante a gestação também são cada vez menores.
Acho muito bom que nossa cultura valorize a gestante, pois ela realmente precisa ser bem cuidada. Ela está no exercício de uma missão sagrada, e qualquer coisa que a afete também afeta o bebê. Existem estudos que indicam, inclusive, que grandes traumas acontecidos durante a gestação afetam mais a vida futura da criança que aqueles ocorridos durante o primeiro ano de vida. Assim, as gestantes devem ser poupadas de estresses desnecessários, de notícias ruins, de carregarem peso, de esperarem longas horas em filas enquanto vão criando varizes.
Nem tudo é perfeito. Creio, por exemplo, que as condições de trabalho das gestantes deveriam ser revistas, com a possibilidade de adaptação – especialmente no finzinho da gravidez. Passar o dia sentada na frente de um computador, por exemplo, é uma bomba pra coluna de alguém que já carrega 10 ou 15kg a mais. Fora que a nossa cabeça fica em outro planeta, então acho que as gestantes deveriam exercer mais atividades manuais e repetitivas e menos atividades intelectuais. Mas, em linhas gerais, acho que as gestantes são relativamente bem tratadas em nossa sociedade.
O mesmo não se pode dizer das puérperas.
Quem são as puérperas? São essas mulheres recém-paridas, com um bebê recém-nascido a tiracolo, vazando leite, transbordantes de hormônios, alegrias, dúvidas, com a vida virada de ponta-cabeça e horas de sono acumuladas. São essas mesmas mulheres às quais tanta gente bem intencionada dá as costas, invadindo suas casas para enfiarem sua cara cheia de germes no nariz do recém-nascido, comerem um lanchinho e saírem, deixando para trás um presentinho para o bebê, a mesa cheia de louças sujas, uma mãe exausta e um recém-nascido agitado.
Muita gente nem cumprimenta os pais: vai logo dizendo “oi, bebê!”, agarrando o pé ou a mão da criatura e perguntando (ou não): “Posso pegar?”. Perguntam se o bebê dorme bem ou se tem cólicas. Mas pouca gente pergunta a uma puérpera como ela está, se está conseguindo repousar, como está se recuperando do parto ou da cirurgia.
Aliás, por falar em cirurgia: já perceberam que se você foi internado pra operar um joelho ou tirar um apêndice é aquela comoção, todo mundo liga, manda flores, visita? Mas se você passou por uma cesárea – uma cirurgia de médio a grande porte –, todo mundo supõe que no dia seguinte você deveria estar saltitando por aí igual a uma gazela?
E as ajudas? Ah, as ajudas! Quantas visitas se oferecem pra segurar o bebê um pouquinho “pra mãe poder descansar”? (O que, em alguns casos, pode realmente vir em boa hora). Mas quantas se disponibilizam para lavar a louça, fazer um chá ou trazer um marmitex pra você almoçar?
A minha impressão é que, pelo menos aqui no Brasil, existe um fascínio pelos recém-nascidos que às vezes é tão grande que extrapola o saudável. Valoriza-se a grávida porque o bebê não tem como sair de dentro dela, ambos são uma coisa só. Mas a partir do momento em que a criança vem ao mundo, todo mundo se acha no direito de reivindicar um pouco (ou muito) dela para si. E o melhor jeito de fazer isso é apagando a mãe, fingindo que ela não existe. “Vai lá trocar seu modess e trazer meu bolinho que eu cuido do seu bebê, ok?”.
Parece que estou sendo radical, mas essa é uma sensação que me acompanhou desde que Emília nasceu e que observo até hoje. Em algumas tribos há lendas de monstros ou espíritos que surgem durante o parto e os primeiros dias após o parto para devorar ou roubar o recém-nascido. Nós também temos os nossos monstros, só que temos de ser educados com eles.
Seria muito bom se mais pessoas olhassem de forma diferente praquela mulher que acabou de dar à luz. Que entendessem que a criança continua fundida a ela, pois nasce imatura, e que a separação total só se dará muitos meses depois. Que aquela mulher segue sendo fonte de vida praquela criança, que é dela que o bebê se nutrirá física e emocionalmente. E que ela, por mais inexperiente que seja, é quem melhor sabe cuidar daquele bebê.
Seria muito bom se as pessoas apoiassem mais os casais de recém-pais, não querendo assumir seu lugar ou agindo como um bando de curiosos (“quero ver com quem o bebê parece!”; “estou doida pra pegar!”; “quero ver se ele é gordinho!”), mas oferecendo a ajuda de que eles realmente precisam. Tomar conta de tarefas burocráticas, como ir registrar o bebê ou marcar a consulta no pediatra; realizar tarefas domésticas, como lavar louças ou esfregar uma roupinha golfada; contribuir para que a puérpera se alimente bem, cozinhando para ela. Esse tipo de ajuda é mais que benvinda.
Quem ama um bebê recém-nascido tem que amar sua mãe antes. Porque eles estão interligados, e você não pode destratar uma mãe sem ofender sua cria ao mesmo tempo. Por isso, minha dica pra quem quer ser melhor amiga (normalmente são as mulheres) dos bebês: cuide bem da mãe deles.