Não lembro quando foi, tanto tempo já faz, que alguém disse que as mães poderiam ser substituídas. Afinal, tem as babás, os professores, os avós, tanta gente dedicada pra fazer o seu serviço. E não precisa nem se preocupar com a alimentação dos bebês pequenos, porque a latinha de fórmula tem exatamente os mesmos nutrientes daquele que a natureza colocou nos peitos de uma recém-parida. Quer dizer, nem sempre parida. Porque também a gente não precisa mais parir, pode deixar o serviço pra algum cirurgião habilidoso.
Fralda, qualquer um pode trocar. Mamadeira, qualquer um pode dar. Parto, não precisa mais. E de onde é que falta tirar a mãe, hem?
Nove meses gestando. Ah, essa tem que ser a mãe. Mas já pensou se não precisasse? Podiam inventar umas estufas de bebês, onde eles seriam assados desde o estado de ovo-zigoto até completa maturação do sistema respiratório. Daí a mãe podia continuar com as baladas, as cervejinhas, os remédios. Olha que beleza se eu pudesse continuar tomando antiinflamatório em vez de combater uma dor de garganta com spray de própolis e chá de alho durante 40 semanas.
Mas sempre ia ter uma retrógrada que ia insistir em fazer tudo como seus ancestrais. Quer dizer, talvez todas as mulheres que sonhassem em ser mães tivessem um desejo oculto de gestar (porque a civilização tenta, mas não consegue dizimar todos os nossos instintos). Mesmo as que não aguentassem o tranco de lutar contra as práticas dominantes. E aí ouviríamos algumas declarações como estas:
- Queria muito ter uma gestação intrauterina, mas meu médico disse que não posso porque minha avó teve um aborto espontâneo. Seria muito arriscado.
- Quero engravidar, mas o médico disse que só espera três meses de tentativas. Quando a mulher demora mais do que isso, é porque o útero não é bom pro bebê. Melhor gestar na incubadora.
- Quero uma gravidez depois de aborto espontâneo, mas não acho um médico que tope acompanhar...
- Eu preferiria gestar meu bebê dentro do meu útero, mas meu plano de saúde não cobre pré-natal intrauterino. Vai ter que ser na incubadora.
Algumas descobririam as recomendações da OMS sobre os benefícios da gestação intrauterina, o reconhecimento precoce da mãe, o papel do toque na superfície da barriga, o som das entranhas maternas, toda essa frescurada. E optariam por gestar elas mesmas seus filhos. Imagino que essas escutariam coisas do tipo:
- Você vai deixar um bebê crescer dentro da sua barriga? Igual bicho?! Vai ficar enorme, cheia de dores, varizes, estrias, hemorróidas... pra quê isso, meu Deus? Só pra dizer que é mulher da idade da pedra?
- Você tem mais de 30 anos e está grávida? Que irresponsabilidade! Tira logo esse menino daí e põe na incubadora, senão ele vai ter Síndrome de Down.
- Menina, você quer engravidar? Olha, já ouvi tanto caso de aborto espontâneo que acho melhor não arriscar. Na incubadora é tudo controlado.
- Eu até entendo mulher que queira gestar um bebê, mas gêmeos não dá, né?
- Ok, você está grávida. Agora não vai me dizer que quer parir também?!!
Os cientistas sérios levantariam evidências científicas e identificariam distúrbios psicológicos importantes em bebês gestados extra-útero. Apontariam as deficiências imunológicas e as carências emocionais. Mas os médicos diriam:
- Bobagem. Meus filhos todos foram gestados na máquina e tá todo mundo bem.
Até o dia em que houvesse um apagão...
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Há 2 meses
22 comentários:
Excelente texto!
Pior que é: sutilmente (ou nem tanto), a tecnologia vai tirando a mãe do seu protagonismo. E muitas tendem a achar bom, porque LA dá mais "liberdade", assim como outros artifícios da vida moderna.
As desculpas para não gerar estão hilárias!
E, ao meu ver, o apagão - o metafórico - já chegou.
Beijos
Nossa... realmente!
Ai que terrível!
Concordo com a Paloma. Parabéns pelo texto!
Cansei de ouvir esse tipo de "desculpas" por optar parto natural, na gestação dos filhos que tive!
E sempre quando diziam: Vc é louca? Sempre respondia: Podem me acusar de tudo, menos de insanidade, por ter optado por uma via já denominada de NORMAL.
Beijos e bom final de semana.
Lia, texto fantástico. Parece que as pessoas se esquecem de que a aproximação, o amor entre mãe e filho, o contato físico, o prazer de ser mãe (para aquelas que realmente o vivenciam e se deleitam com ele), são insubstituíveis. A tecnologia ou a "terceirização" das demandas maternas jamais conseguirão supri-los. Isso é impossível.
Bjos!
Muito legal, lembrei do filme Gattaca!
Mas já que é pra ir pra encubadora melhor seria incluir no plano os três meses de "externo gestação" no plano né?
beijos
Ai, ainda prefiro as mães de verdade. Vc confia na Eletropaulo para nos substituir?? Hahahaha!
Bjos,
Camila
www.mamaetaocupada.blogspot.com
Brilhante! clap! clap! clap!
SENSACIONAL!
Adorei! Minha cabeça voou longe e foi parar no Matrix e os jogos pós-apocalípticos que o marido joga. Que texto! Beijos.
Lia, adorei o texto! Me lembrou muito um que a Kalu do mamíferas escreveu há um tempo atrás, "Quando tecnê venceu Gaia", não sei se vc leu, ms tb é ótimo e recomendo!
Já viu uns cartazes com incentivo à maternidade? Eles dizem exatamente isso oq vc falou, se não me engano uma das frases é "primeiro te convencem a dar mamadeira, depois tentam dizer que vc é insubstituível".
Estão cada vez mais repassando o papel das mães pra outros cuidadores, mas sabe, nem acho isso de todo ruim, pq tem muita mãe por aí q não quer cuidar dos filhos, agora, o que me assusta mesmo são essas mães que repassam de bom grado a maternidade.
Aqui é a maior briga com a família do marido pq todo mundo lá tomou mamadeira, chupou chupeta e fez cesárea. Daí da última vez que levei Aurora lá, os comentários gerais foram "ela AINDA mama?" como assim ela AINDA mama? Ela SÓ tem seis meses e já tá todo mundo querendo tirar de mim, enfiar um mucilon goela abaixo e me substituir.
Essa realidade é muito, mas muito triste! Eu achei que as coisas só fossem assim no quisito parto, mas vejo que se repete com a amamentação e com a maternagem no geral.
Mas adorei o texto! Genial!
beijocas,
Aretha
excelente, querida.
sabe que essa semana teve uma reunião na escola do noah, e eu fiquei impressionada com a postura da diretora.
estávamos na mesma sala, tanto nós, os pais que deixam os filhotes part time (9-13hs) quanto aqueles que deixam a cria full time (8-19hs).
pois a diretora da escola disse NA LATA aos pais full time que essa não é a melhor opção e que o ideal é que a criança fique menos tempo que isso.
ela disse "vocês me desculpem, mas todos sabemos que um bebê de 2 anos e meio é muito pequeno pra ficar tantas horas longe da mãe."
fiquei PASSADA, me abanei e fiquei com uma certa peninha da galera que tinha que trabalhar full time, ficar longe da cria e ainda ouvir sermão da diretora da escola para a qual, não, a mãe não é substituível.
adorei o texto.
beijo!
Muito bom o texto, Lia. Vai bem no centro da coisa toda, que é simplesmente deixar a natureza fluir e os instintos aflorarem. A tecnologia trouxe (e traz) coisas ótimas sim para a humanidade, mas também outras bem opostas, que acabam mais por prejudicar quem delas pretendia se beneficiar. Que medo desse futuro...
bjos
Me veio na cabeça aquela cena do Matrix onde Neo está em um "útero" articificial, já adulto, esperando pra ser libertado (?). Sci-Fi ou não?
Bj
Genial! :D amei o texto!!
vc esta demais hein!! Adorei o texto!
Bijim : )
uhuuulll!
texto incrível, lia!
nem tinha visto que você já tinha postado.
a-mei. me empresta?
bejo
clap clap clap
clap clap clap clap...Ameiiiiii este texto, perfeito e diz tudo que precisa ser dito...Me empresta também...vou guardar as devidas apresentações, mas eu preciso deste texto pra amigas que estão decidindo pela cesárea e LA antes mesmo de conceber seus bebes...Meus parabens, mente iluminada...Bjo
nossa lia, não tinha lido esse post!
você se superou.
(e nem levou pedrada, sua radical xiita e sei-lá-mais-o-quê! rá!!!)
beijos de uma companheira louca da idade da pedra
kakakakaka adorei!!!!! sensacional!
Lia do céu! Amei esse post, obrigada! Hahahha (to rindo mas o assunto é serio).
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