Minha filha tem bronquite crônica. Ou asma, para simplificar. Há quem considere que a asma só se caracteriza em indivíduos com mais de dois anos, mas sendo os sintomas idênticos, assim como o tratamento, podem chamar como quiserem.
Para quem não é familiarizado com a coisa - como eu não era -, funciona mais ou menos assim: seja por um vírus, uma mudança no tempo, um estresse, a pessoa desenvolve broncoespasmos, ou a chamada "falta de ar" - que, na verdade, parece que é um "excesso de ar", que fica preso nos pulmões. É como uma asfixia. Eu prefiro chamar de falta de ar mesmo, porque a oxigenação fica prejudicada e o coração acelera.
O aspecto mais notável em um bebê com crise de bronquite é que ele fica com a respiração ofegante. A costela sobe e desce, a barriguinha parece uma gaita de fole e o pescoço afunda, deixando ver aquele ossinho entre as clavículas. Além disso, a criança tosse muito (começa com uma tosse seca, que depois vai ficando mais produtiva), o nariz escorre e pode ficar obstruído, ela vomita (pela tosse e por causa do catarro que engole), o intestino tende a ficar mais solto e com catarro nas fezes. Nas crises mais feias, o apetite vai embora e a criança fica molinha, às vezes com febre, e muito, muito cansada.
O tratamento alopático tradicional consiste em broncodilatador, inicialmente, para abrir os brônquios e tirar a criança do afogamento. Se o peito estiver chiando, é prescrito corticóide. Se houver febre persistente e suspeita de pneumonia (porque muitas vezes a bronquite evolui para um quadro de infecção bacteriana), passa-se um antibiótico. Os médicos recomendam aliar a esse tratamento sessões de inalação com soro fisiológico, lavagem do nariz também com soro, saunas no banho e muito líquido. Para os pais ou cuidadores da criança, pensem o que isso representa - especialmente porque durante uma crise de bronquite a criança costuma acordar a noite inteira e tossir mesmo enquanto dorme, nos deixando em constante estado de alerta.
Nossa primeira bronquite - ou bronquiolite, que é a bronquite de bebezinhos - aconteceu aos seis meses de Margarida, como contei
aqui. Nós éramos totalmente inexperientes no assunto, tendo sido presenteados com uma primogênita que sempre teve uma saúde de ferro. Começou com um pequeno resfriado, que logo evoluiu para tosse e falta de ar. Ela foi internada e recebeu todo aquele pacote de medicamentos que eu citei acima.
Como a bronquiolite era a doença do momento, os médicos acreditavam que teria sido um episódio pontual. Pouco mais de um mês depois, ela teve nova crise. Não internamos nem demos antibiótico, mas ela precisou de cinco sessões de fisioterapia respiratória para expulsar o catarro. No mês seguinte, nova crise. E, pela terceira vez em dois meses, meu bebê tomou corticóide.
Convencidos de que era uma coisa crônica e determinados a não dar mais corticóide pra Margarida, procuramos a homeopatia. Comecei amadoristicamente, e no resfriado seguinte pesquisei no site da Weleda alguma medicação indicada para bronquite. Usei o remedinho antroposófico, mas quando ela chegou a ficar com a respiração curta levamos ao nosso pediatra (alopata). Para nossa alegria, ele disse que era necessário o broncodilatador mas que podíamos dispensar o corticóide dessa vez, já que o quadro não estava tão feio. Desde então, Margarida nunca mais tomou corticoide. Era um sinal de que estávamos no caminho certo.
Mesmo tendo dado mais ou menos certo minha experiência com a auto-medicação, procuramos um médico homeopata. E foi então que começou minha transformação.
A homeopatia tem uma proposta diferente da alopatia. Enquanto esta ataca o sintoma, aquela busca tratar o indivíduo como um todo, tentanto reequilibrar o que está causando o desequilíbrio. A doença não é um mal em si, mas deve ser compreendida. Para os mais céticos, pode parecer balela. Afinal, o que eu estava querendo era que minha filha ficasse boa. Mas a alopatia não estava resolvendo nada. Eram crises atrás de crises e eu era obrigada a usar sistematicamente um medicamento perigoso (corticóide, só por alto, pode afetar o crescimento, alterar o metabolismo de gordura, causando acúmulo de gordura em órgãos internos, além de inibir o funcionamento da glândula suprarrenal. Médicos, fiquem à vontade para acrescentar ou corrigir qualquer coisa). Então, acreditando ou não, tínhamos de tentar.
Na primeira consulta com o homeopata, ele perguntou várias coisas sobre a gestação, o parto e questões minhas que poderiam estar desequilibrando minha filha. Não há para onde fugir: a asma, talvez mais que a maioria das doenças, é emocional. Eu havia lido Laura Gutman, e aquilo teve eco em mim.
Veio então a primeira crise depois que já estávamos com um homeopata, e ele passou a medicação por telefone. Estávamos dando broncodilatador a cada 4h. Depois de umas 3 ou 4 doses da medicação, Margarida começou a respirar melhor e já pudemos espaçar a bombinha. Em dois ou três dias, havíamos suspenso totalmente o broncodilatador, e ao cabo de uma semana ela estava totalmente sem sintomas (nem um nariz escorrendo). Foi bastante animador.
Já na segunda crise pós-homeopatia, a medicação não funcionou tão bem. No fim de julho, viajamos pra Fortaleza com Margarida meio mais ou menos. Chegando lá, ela teve uma piora sensível e, em vez de ligar pro nosso homeopata, resolvemos levá-la em outro lá mesmo para uma avaliação completa. Levei-a ao mesmo médico que havia me tratado quando criança, e ele foi categórico: "Ela vai ficar boa. Suspenda o broncodilatador." Foi o tratamento mais eficaz que já experimentamos. Nosso homeopata de Brasília era da linha unicista (passa um remédio só). Esse de Fortaleza era da linha complexista, e passou logo três compostos com 7 princípios ativos para dar a cada meia hora. Margarida melhorou rapidamente e pudemos curtir muito nossa viagem.
Achávamos que tínhamos encontrado nosso médico e nosso remédio. Mas foi só pisar em solo brasiliense, com a umidade desértica, que Margarida começou a espirrar. Umas duas semanas depois, nova crise. Usamos a mesma medicação, mas dessa vez a crise foi mais teimosa e precisei chegar a intervalos de 15 minutos pra que ela melhorasse. Mas melhorou.
E aqui estamos nós, umas três semanas depois, e Margarida com uma crise braba. Usei os remédios do médico de Fortaleza a cada 15min e não fez nem cosquinha. Decidimos, então, procurar outro médico - o sexto da vida de Margarida, fora os do hospital.
Ouvindo a história sobre como os medicamentos funcionam uma ou duas crises e depois não resolvem mais, ele comentou que parece que nós a cercamos e ela foge. Perguntou sobre o temperamento dela (eu não sabia responder a muita coisa, ela ainda nem completou um ano), fatos externos que poderiam a estar deixando triste, ciúmes etc. E, claro, passou novos remédios. Que, claro, estão funcionando lindamente (Deus sabe até quando).
Mas toda essa ladainha não é pra me lamentar do fato de que minha filha tem asma, de que eu tenho gastado centenas de reais por mês com médicos e remédios, de que eu adiei o início do meu mestrado por causa disso. Toda essa ladainha é tudo, menos para me lamentar.
Todos os médicos a quem visitamos nessa época foram maravilhosos - inclusive os alopatas prescritores de corticóide. Eles trabalham com o que conhecem. Mas temos sido obrigados a peregrinar como nômades, porque cada crise nos desconcerta, nos desestrutura, e nos faz voltar à estaca zero. Então, não condenemos os médicos.
Tampouco condenemos a homeopatia. Homeopatia funciona, gente, e continuaremos nessa via. Mas os efeitos dela são menos previsíveis que os da alopatia, dependem muito da reação do indivíduo - daí vai a competência do médico pra acertar o remédio, porque a relação não é tão simples como na alopatia (analgésico pra dor, broncodilatador pra broncoespasmo, antiinflamatório pra inflamações, antibiótico pra infecções bacterianas e por aí vai).
O último médico a quem nós fomos (assim como o primeiro homeopata) nos provocou no sentido de procurarmos possíveis mensagens na doença da Margarida. O que ela está nos comunicando com isso? Não que isso vá resolver o problema. Se o problema dela é que ela tem crise de asma quando fica triste, fazer o quê? Impedir que ela fique triste?
Entramos na seara de não mais curar a asma, mas conviver com ela. E crescer com ela. A cada crise, repensar nossa vida, nossas escolhas, nossos dilemas e preocupações. E eu, como mãe fusionada a esse serzinho, estou mergulhada até o pescoço.
"Esses pequenos dão um show na gente", concluiu o médico. E dão mesmo.
 |
Aos seis meses, mamando na UTI |