domingo, 25 de setembro de 2011

Relato do parto de Margarida - Parte 1

Iahweh disse a Abrão: "Sai da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, para a terra que te mostrarei. Eu farei de ti um grande povo, eu te abençoarei, engrandecerei teu nome; sê uma bênção! (...)

Gn 12,1-2

Quando dermos à luz em plena posse de nossos meios, na alegria, e não na “dor”, teremos dado um passo a mais, como coletividade, em direção a uma vida melhor.

Hélène Cornellier


MEU RELATO DE PARTO
Nascimento de Margarida, minha segunda filha

Dedico este relato à minha filha Emília, minha primogênita, que me fez mãe. Emília me mostrou que sou capaz de gestar, parir, alimentar e criar meus filhos, e me fez ter vontade de ser mãe de uma grande prole. Abriu as portas para que seus irmãos chegassem com mais facilidade. Com sua força, transformou meu corpo e meu coração.

Este parto também é fruto do amor, da compreensão e do apoio do meu marido Rafael, que caminhou ao meu lado ao longo das minhas gestações e dos nascimentos das nossas filhas. Com seu carinho e seu coração aberto, pude ganhar total confiança nas escolhas que, juntos, fizemos para a nossa família.

Ao Deus de Abraão, Isaque e Jacó; de Sarah, Rebeca, Lia e Raquel. Ao autor da vida. Àquele que é poderoso para fazer infinitamente mais do que tudo que pedimos ou pensamos. A ele seja a Glória deste e de cada nascimento.

Prólogo

Este relato começa muito antes do dia 10 de setembro, quando tomei Margarida nos braços pela primeira vez. Nossa história de parto, que inclui toda a nossa família – Margarida, Emília, Rafael e eu –, teve seu início mais de dois anos antes, quando eu carregava no ventre a pequena Emília, ainda um embrião.

Sempre dei muita importância à via de parto, talvez mais que a maioria das mulheres. E, cedo, descobri que enfrentaria dificuldades para ter um parto normal no país em que vivo. Para realizar algo que é um reflexo voluntário do corpo feminino, e que sempre foi feito naturalmente ao longo de milhares de anos, agora era necessário se informar, buscar apoio, gastar dinheiro e contar com a sorte. Minha caminhada começou durante a gestação de Emília, e culminou com um parto vaginal vitorioso e muito batalhado, mas repleto de intervenções.

Mesmo radiante de alegria por ter conseguido parir e, sobretudo, por ter minha filha nos braços, ficou uma ferida. Uma ferida física pelo períneo cortado a tesoura, mas uma ferida emocional muito mais profunda por ter me sentido parcialmente incapaz de dar à luz e, acima de tudo, por ter passado as primeiras horas de vida da minha filha afastada dela. Emília abriu as portas, não apenas fisicamente, trabalhando meu corpo para as gestações e os partos que se seguiriam, mas plantando no meu coração um desejo urgente e irresistível de resgatar as lacunas da experiência que vivi.

Desde que Emília saiu do meu ventre, passei a estranhar meu corpo não grávido. Eu amava gestar, carregar aquela barriga enorme e pesada, estar o tempo inteiro em contato profundo com o meu bebê. E sabia que não poderia passar muito tempo de outra forma. Eu amamentava Emília, amava sentir meus seios fartos de leite, ainda que doloridos e incômodos. Gostava de perceber meus órgãos internos retornando aos seus lugares, como uma recordação do tempo em que ela agitava a superfície do meu útero. Eu era perfeitamente feliz, não me recordo de ter sido tão feliz em toda a minha vida.

Ainda durante o refúgio da minha licença-maternidade, comecei a buscar leituras mais profundas sobre parto e investigar o que havia acontecido no nascimento de Emília. Cheguei à conclusão que tive a melhor experiência que podia ter naquele momento, com o meu grau de informação e a minha maturidade. Mas eu havia crescido de forma tão radical que não era mais possível me contentar com aquilo.

Pouco depois de voltar a trabalhar, comecei a freqüentar um grupo de apoio na minha cidade (Ishtar Brasília), onde conheci pela primeira vez uma parteira. Entrei em contato com mulheres que tinham vivido seus partos fora do ambiente hospitalar e compreendi que havia outras opções para um nascimento digno. Li muitos e muitos livros, estudos científicos, teses de doutorado. Mas, acima de tudo, entrei em contato com o meu coração e com o mandado divino que eu recebia: darás à luz em meio a dores. Mas não seriam dores malditas. Seriam dores de redenção, de vida, de crescimento espiritual. Não a dor da experiência roubada, da sensação de violação. Dor apenas, não um sofrimento. Uma dor somente física, não anestesiada por drogas e muito bem-vinda, pois viria a tratar minha alma. E eu a atravessaria de mãos dadas com o meu marido, com a presença discreta, silenciosa e reconfortante da minha parteira e da minha doula.

(continua...)

17 comentários:

Tchella disse...

"dor apenas, não sofrimento" EXATAMENTE!!!! mas é dificil das pessoas entenderem isso.

ameiiii o relato, e espero ansiosa a continuaçao.

Lia, sinceramente, tu és uma bençao!
Bjos

Tchella disse...

nao resisti, te linkei lá! bjo grande

Paloma Varón disse...

Ai, Lia, vc mal começou e já estou emocionada. Que bom ter acompanhado isso tudo tão de perto!
Com certeza Emília abriu muitas portas, é a tal da maternidade que nos inunda e transforma. Somos pessoas melhores, sem dúvida, depois dela.
Beijos

Nuana disse...

Parabéns mais uma vez, e Margarida era o apelido carinhoso da minha vó que eu amo ainda mesmo tendo partido....lindaaa....bjooo

Fernanda disse...

Também estou ansiosa!! Este relato de parto é o mais esperado do ano!!! Beijos

Ivna Pinna disse...

Lia, se a primeira parte já tá assim -linda!- imagina a continuação!

Beijos

Thaís Rosa disse...

lindo, lindo, lindo.
fico feliz demais quando encontro alguém que viveu a gravidez, o parto e vive a maternidade como eu: feliz, realmente curtindo aquilo.´Porque é claro que, em cada uma destas etapas terão dificuldades, dores, mas estão diretamente ligadas às alegrias, aos prazeres. Porque hoje tá na moda falar de maternidade real , né, e sai todo mundo falando dos podres da gravidez, do parto, da maternidade, pra dizer que é de verdade. E aí, quando alguém (como nós)fala que nunca se sentiu tão bem qdo como esteve grávida, ou que parir foi a maior experiência de uma vida, soa romantizado, "maquiado", como tem se falado por aí.
Temos mais é que anunciar essa boa nova, como vc já começou tão lindamente nesse relato.
beijo parceiro,
thaís

Tathyana disse...

Mais, mais, mais....incrível começo, louca para ler o restante!!! Bjssssssssssss

Mariana - viciados em colo disse...

estou emocionada e ansiosa pela próxima parte.

beijoca,
mari
viciadosemcolo.blogspot.com

Chris disse...

Me identifiquei muito com seu relato, principalmente a parte de sentir falta da barriga. Minha filha hoje tem 16 meses e nao ha um dia sequer que eu nao sinta falta de um serzinho crescendo dentro de mim, me fazendo companhia na ida e na volta ao trabalho. Sai do meu parto (normal, com parteira, mas longe de ser meu ideal) querendo outro e querendo viver essa experiencia de gerar, parir e cuidar pra sempre. Aqui em Londres eh um pouco mais facil em termos de parto normal, mas tambem nao eh perfeito. Seus textos ajudam bastante no planejando do proximo (sabendo que cada parto eh um parto e cada experiencia eh unica).

Maria Betânia de Amorim disse...

Lia parabens pelo conteudo do seu relato, conseguiste repassar em poucas linhas de forma tao profunda e verdadeira, em tao poucas linhas me fizeste relembrar o nascimento da minha primeira filha e desejar ainda mais esse segundo parto que esta por vir. Espero ler a continuacao da segunda parte deste relato que ja se inicia tao lindo e tao rico. Maria.

Cíntia disse...

Que bom que você teve a chance de viver um parto sem intervenções. Que benção! Abraços

Sarah disse...

Dá para sentir sua emoção nesse relato Lia. Vc passa pra gente lindamente o que viveu. Gostei particularmente de duas coisas: do agradecimento à Emília, que como vc disse "abriu as portas", e do trecho "tive a melhor experiência que podia ter naquele momento, com o meu grau de informação e a minha maturidade". Também sinto isso, vivi o que tinha que viver no meu parto, principalmente para buscar algo diferente em um próximo...
Vou acompanhar as próximas partes!
bjos!

Fabi Alvim disse...

Lia, estava ansiosa pelo relato... pessoas como vc me ensinam tanto! Suas palavras delicadamente pensadas e escritas com um amor tão explícito só me fazem ansiar pelas próximas partes.

Luíza Diener disse...

é que eu comecei a querer chorar já no pré-prólogo. vamos, então, ler o resto do relato

Patrícia Boudakian disse...

lia, querida. eu tb nunca me senti tão bem como enquanto grávida. pareço não ter nascido pra outra coisa além de gestar e parir. tô aqui começando a ler o relato e já cheia de emoção, revivendo meu parto.

obrigada por compartilhar.

beijo!

Gabi disse...

lia, estou citando o seu relato lá no Dadadá! Queria que soubesse como ele me ajudou a construir minha história!


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